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segunda-feira, 14 de abril de 2014

O novo desafio da NATO - é urgente investir na defesa

O Novo Desafio da NATO

Este é um artigo de opinião de Sam Jones que escreve no Financial Times (
décadas o Ocidente selou uma suposta ‘détente’ permanente com a Rússia, mas o Kremlin mudou de estratégia e enviou dezenas de milhares de tropas para a fronteira com a Ucrânia, às portas da Europa. Afinal o jogo ainda não acabou, apenas começou o próximo ‘round’.
O novo desafio da NATO

A faceta militarista da Rússia está de volta. Segundo estrategas da Aliança Atlântica, este é o maior desafio que os 28 estados da organização enfrentam em décadas. "É um momento crucial para a arquitectura de segurança que construímos em conjunto nas últimas décadas", afirmou Anders Fogh Rasmussen, secretário-geral da NATO, esta semana em Paris.

Resta saber se a Aliança Atlântica vai emergir revigorada ou polarizada. "É uma situação comparável, senão mais preocupante e perigosa, à crise nos Balcãs após a queda da União Soviética. Mas o aspecto mais preocupante é o potencial de confronto directo com a Rússia que hoje existe", explica o almirante James Stavridis, actual reitor da Fletcher School na Universidade de Tufts, EUA.

Os analistas dizem que a NATO tem três grandes desafios pela frente. O primeiro é inverter a queda acentuada no orçamento europeu para a Defesa. O segundo passa por tranquilizar os EUA sobre a relevância da Aliança e o terceiro implica reafirmar a sua credibilidade perante os novos membros.
Olhando para os orçamentos militares da Europa verificamos que o panorama não é animador. Os cortes a longo prazo têm sido exacerbados pela crise financeira e segundo o International Institute for Strategic Studies, a despesa com a Defesa caiu, em termos reais, 21,5% em Itália, 9,1% no Reino Unido e 4,3% na Alemanha, enquanto em França se mantém desde 2008. No mesmo período, a despesa militar da Rússia aumentou 31,2%.

É urgente investir na Defesa
A recomendação da NATO aos seus membros vai no sentido de gastarem o correspondente a mais de 2% do seu PIB anual na área da Defesa, mas apenas quatro dos 28 estados que integram a Aliança cumprem esse objectivo. Em certos casos, os números mascaram problemas mais profundos que afectam vários países aliados. "A despesa com o pessoal é um deles. Num caso em particular, 85% dos gastos vão para salários e pensões no sector da Defesa, o que significa que não há margem para comprar novo equipamento, por exemplo", refere um estratega sénior da NATO.

A organização recomenda aos seus membros que apliquem 20% do seu orçamento militar à aquisição de material, mas apenas 11 cumpriram essa meta no ano passado. "Esse tipo de quebras, combinadas com o alargamento da Aliança, levou à actual fragmentação. O que aconteceu nas últimas semanas mostra que chegamos a um ponto de inversão", sublinha um estratega.

Até agora, só os estados bálticos se comprometeram a reforçar os respectivos orçamentos e a atingir as metas definidas pela NATO na sequência da anexação da Crimeia pela Rússia. No caso dos países do Sul da Europa, as restrições orçamentais inviabilizam qualquer despesa adicional. Por ora, França e Reino Unido também congelaram os investimentos na Defesa.

Dos maiores estados europeus que integram a Aliança só a Alemanha tem dinheiro para ir além da retórica. A ministra da Defesa, Ursula von der Leyen, e o presidente alemão, Joachim Gauck, apelaram à adopção de uma política militar mais robusta, porém o país continua profundamente dividido sobre essa questão. Mas não só. É fundamental que despesa europeia na área da Defesa cresça para dar resposta ao segundo maior desafio que a organização enfrenta, isto é, manter a sua relevância perante os EUA numa altura em que o seu interesse estratégico passou a ser a região da Ásia-Pacífico.

"Os EUA acreditaram durante algum tempo que o projecto europeu estava consolidado e, como tal, podia centrar a sua atenção no Pacífico. É natural que reiterem o seu compromisso, mas se os estados europeus não aproveitarem esta oportunidade para repensar o seu orçamento de Defesa, pergunto-me a que ponto os EUA poderão justificar uma presença robusta no futuro", realça Kathleen McInnis, perita da NATO na Chatham House.

A importância de estar no sítio certo

No entanto, a maior ameaça à credibilidade da organização não vem do outro lado do Atlântico, mas sim do extremo Leste da Europa. "Passamos 20 anos a dizer aos europeus de Leste que eram paranóicos, viviam no passado e deviam tratar a Rússia como um país normal. Mas agora quem tem razão são eles. A NATO tem de fazer um trabalho de sensibilização inteligente para esses países continuarem a acreditar na Aliança", diz Jonathan Eyal, director de Estudos Internacionais no ‘think-tank' Royal United Services Institute.

O debate vai ser duro e, muito naturalmente, vai centrar-se no pré-posicionamento ou no estacionamento permanente de tropas da NATO em estados membros como elemento dissuasor. Donald Tusk, primeiro-ministro da Polónia, já pediu à Aliança que envie tropas para o seu país, mas não é provável que a organização possa dar uma resposta à altura nos próximos anos. Até lá, o mais provável é que a NATO se comprometa a levar a cabo um maior número de operações temporárias e de exercícios militares nos seus territórios a Leste.

Rasmussen deu inclusive a entender numa recente declaração que a Aliança poderá vir a estabelecer bases logísticas. "Temos de desenvolver um plano de acção para fortalecer a nossa capacidade de reacção. Se não estivermos no sítio certo não conseguiremos assegurar uma resposta rápida". Quanto mais pró-activa for a NATO - e quanto mais tropas enviar para o terreno -, maiores serão as probabilidades de a Rússia encarar essa pró-actividade como uma provocação.